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Homofobia, Sexismo e violência nas escolas

Tudo o que discutimos até aqui tem um impacto direto sobre nossas práticas cotidianas nas escolas. Como professores e professoras, desejamos um padrão de estudante. Queremos que todos aprendam do mesmo jeito e ao mesmo tempo, queremos que todos se comportem de uma mesma maneira, queremos um formato único de aluno. Porém, essa nossa expectativa nega algo que é inerente à condição humana: a diferença.

Entender a diferença como algo do humano reposiciona nossas atitudes. Saímos de um discurso de “tolerância” ou “respeito” à diferença para entendermos que a diferença constitui a realidade. Dessa forma, nossas intervenções partem de um pressuposto: existe uma diferença a ser respeitada por alguém que está em um outro lado, o lado dos iguais. Por exemplo, quando discutimos que é preciso respeitar os moradores da zona rural, estamos dizendo nas entrelinhas que eles são menos que os moradores da zona urbana e, por isso, é preciso se pensar em estratégias para respeitá-los.

Se nossa sociedade considerasse a diferença como um direito de todos, não seria preciso se criar estratégias de proteção ou campanhas educativas para respeitar aqueles grupos que têm menos prestígio social e são considerados “os diferentes”. A escola pode contribuir no processo de educação para o direito à diferença.

A negação do direito à diferença produz experiências de enorme sofrimento no cotidiano escolar. Vejam o exemplo abaixo:

 
   

Vamos propor a você assistir um vídeo que é um pequeno trecho de um dos episódios do Programa Profissão Repórter da Rede Globo de Televisão exibido no dia 19 de junho de 2009.

O tema desse programa específico é a Escola de Periferia e retrata uma escola na Zona Leste de São Paulo, o prédio e a precária conservação de seu mobiliário, os seus profissionais com duplas ou triplas jornadas de trabalho e os jovens alunos com suas vivências na sala de aula.

Acompanha-se a vida de alguns alunos, mas, em meio à exibição, um assunto se destaca: o caso de suicídio de um menino de 14 anos e é sobre isso que o trecho selecionado aqui fala. Veja o vídeo.

Iago, um aluno que poderia ser um jovem aluno de sua escola, mata-se por ser discriminado ao ser visto como homossexual. Percebam que em nenhum momento se diz que ele seja homossexual, mas sim que ele tinha comportamentos, trejeitos, que não atendiam as expectativas sociais exigidas pelo binarismo de gênero.

Perdeu-se uma vida.

O irmão de Iago aponta como a escola não prestou ajuda e se omitiu frente às manifestações de homofobia. No vídeo, a vice-diretora, ainda desconcertada pelo acontecimento, diz da pouca capacidade da escola de lidar com esse fato.

 
 

Tratar dessa questão é um desafio para a escola que, muitas vezes, crê que o discurso do respeito e da tolerância vai resolver a questão.

Porém, apenas discutir o respeito e a tolerância, sem ações concretas de proteção que os materializem, não são suficientes. Há demandas concretas de proteção e inclusão a serem feitas. Além disso, é preciso que a escola promova a diferença como um direito, como um fato constituidor da realidade.

Olhe ao seu lado, veja as situações cotidianas em que a omissão de alguns é a manifestação de uma ordem injusta.

Diante das cenas de violência, opressão e omissão de que vocês devem ter se lembrado, percebemos a necessidade de discussão desse tema. Não por modismo ou por que está na mídia, mas pela lembrança de situações concretas que acontecem nas escolas em que vocês trabalham. É importante perceber que a urgência desse tema e sua presença na mídia se justificam por ser intolerável que o Brasil seja o país com maior quantidade de assassinatos de cunho homofóbico. Segundo pesquisa realizada pela UNESCO (CASTRO, ABRAMOVAY e SILVA, 2004), a violência contra homossexuais é, entre os alunos de quinze capitais brasileiras pesquisadas, a mais aceita e considerada a menos violenta. Esse dado nos mostra como as várias cenas cotidianas de preconceito e discriminação que acontecem em relação à orientação do desejo sexual, que não são problematizadas ou discutidas no contexto escolar, perpetuam uma naturalização de piadas, brincadeiras e humilhações que podem resultar em atos desesperados como o de Iago.

A escola não pode lavar as mãos frente ao sexismo e à homofobia. É preciso desnaturalizar as desigualdades de gênero e combater a heteronormatividade.

Muitos professores e professoras têm receio de se engajar nessa luta por suas convicções pessoais. É necessário, entretanto, entender esse engajamento como parte da nossa profissão como educadores e levar em consideração que a omissão da escola e a ausência dessa temática no currículo podem vir a trazer consequências danosas, algumas delas até irreversíveis, como no caso do suicídio de Iago.

Não podemos, em nome de um princípio moral particular, impedir os nossos jovens alunos e alunas de viverem sua identidade de gênero e a sua sexualidade, mesmo que particularmente não nos sintamos à vontade com algumas dessas expressões.

Por isso, a escola republicana mantida pelo Estado é pública, laica e gratuita, pois esses são princípios universais que buscam superar constrangimentos de ordem ideológica, religiosa e financeira. Dessa forma, espera-se que, na escola, as interações entre os indivíduos baseiem-se na percepção do direito à diferença e da possibilidade de igualdade de tratamento e acolhimento a todos os estudantes. É preciso combater olhares particulares que incentivam posições discriminatórias, excludentes e injustas que poderão estreitar os espaços de participação e excluir alguns que não cabem em determinadas óticas.

Veja a pesquisa completa da UNESCO.

Ampliar o olhar em relação aos padrões estabelecidos para homens e mulheres, transexuais, travestis, gays, lésbicas, entre outros, é uma necessidade em uma escola que se pretende inovadora. Inovar é lidar com o tempo presente e o tempo futuro. É plantar o respeito, a flexibilidade e a possibilidade de coisas novas! Esperamos que, na escola de vocês, essas discussões possam ocorrer sempre!